Nações consideradas de primeiro mundo fizeram da inovação uma ferramenta para desenvolverem suas economias. O Brasil, por outro lado, tem ficado para trás nesse sentido. Pesquisas como a do Banco Mundial sobre o tema, ainda nos anos 2000, revelaram que no país não existe um sistema nacional de inovação eficiente, com baixa taxa de transformação de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em aplicações comerciais, explicado pela “fraca colaboração entre empresas privadas e universidades”.
O cenário se perpetua até hoje, na avaliação de especialistas do setor. O tema foi debatido nesta sexta-feira (2), em palestra promovida pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), em Brasília (DF), sobre a Lei de Inovação (nº 10.973/04) e o novo Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei n° 13.243/16). Segundo Edilson da Silva Pedro, analista de Planejamento, Gestão e Infraestrutura de C&T da Secretaria Executiva do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), mesmo com leis voltadas ao setor, o Brasil ainda não possui uma política de inovação.
“Temos a Lei de Inovação, que foi regulamentada, mas ainda não é uma política de inovação”, apontou o analista. “O certo é primeiro vir a política, depois a estratégia, e mais tarde a lei para regulamentar como tudo será executado. Quando se coloca uma lei na frente da política, não se tem política. Por exemplo, qual o objetivo do Brasil com ciência, tecnologia e inovação? A Lei de Inovação não estabelece isso. Faltam conceitos claros”, alertou.
A situação das instituições científicas e tecnológicas (ICTs) no Brasil são a prova, na visão de Edilson, de como o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) tem sérios entraves. “Produzimos tecnologia nas ICTs, mas é tudo muito travado. Na hora de transferir tecnologia é um problema que começa já na hora de patentear, porque leva-se anos. Há ainda problemas com órgãos de controle, recursos humanos, nas bolsas, nas agências de fomento”, enumerou.
A última política de peso dos Estados Unidos, por exemplo, para acelerar a transferência de tecnologia será voltada aos setores considerados estratégicos na economia em 2030. Isso inclui as áreas de tecnologias da informação e comunicação (TICs), big data, internet das coisas (IoT, na sigla em inglês), energias renováveis, entre outros. “Ou seja, eles estão olhando para o futuro, para quais serão as tecnologias estratégicas que vão abastecer o Produto Interno Bruto [PIB] americano nos próximos anos. É isso que temos que buscar”, afirmou Edilson da Silva.
“A lei 10.973 não cumpre o papel da política de inovação, tão pouco a nossa Estratégia Nacional de CT&I [Encti]. Há um vazio com relação tanto a coordenação quanto a diretrizes claras do que deve ser cumprido na realidade do Sistema Nacional de Inovação do Brasil”, resumiu a economista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e tecnologista do Ibict, Cristiane Rauen.
Grupo de pressão
Na avaliação do consultor legislativo da Câmara dos Deputados, Claudio Nazareno, a falta de uma política clara para inovação, aliado a um sistema nacional de CT&I precário, propicia “apropriações indébitas” de grupos econômicos poderosos, que prejudicam o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro.
“Posso citar vários exemplos. No Congresso vamos ter que analisar uma política nacional para o desenvolvimento da nanotecnologia, outra para indústria farmacêutica, outra de terras raras. Isso tudo dá direito a algum determinado grupo de pressão ter mais força para colocar o seu puxadinho na frente de outro. Quanto mais articulado o setor, melhor ele consegue sair na lista de largada. Por isso é fundamental um sistema nacional que estabeleça diretrizes”, disse.
Segundo Nazareno, o Brasil tem cerca de 14 mil leis em vigor. Contudo, o país possui muitas instituições, gasta demais com o serviço público, e não tem uma infraestrutura pública coordenada. “Resolvemos na área de CT&I desde o satélite até o patrimônio genético, tudo isso posto em 49 grandes artigos. Mas não se tem dinheiro, não se fiscaliza e não se faz. É preciso reorganizar o que já existe, para se fazer melhor uso dos bens públicos”, aconselhou.
Solução
De acordo com o analista do MCTIC, uma possível saída para introduzir uma política de inovação no SNCTI pode estar no novo Marco Legal de CT&I – que altera e reescreve, entre outros dispositivos, a própria Lei da Inovação. “Nós colocamos o artigo 15-A na Lei 13.243/16, uma diretriz importante de ser apropriada. O dispositivo deixa claro que as ICTs públicas vão ter que, a partir da regulamentação da lei, desenhar uma política de inovação para elas”, informou.
Com a medida, as ICTs vão instituir sua política de inovação na organização e na gestão dos processos que orientam a transferência de tecnologia e na geração de inovação no ambiente produtivo, “em consonância com as prioridades na política nacional de CT&I e com a política industrial e tecnológica nacional”, salientou Silva. Serão estabelecidas diretrizes e objetivos estratégicos de atuação institucional no ambiente produtivo local, regional ou nacional, em temas como gestão de incubadoras, propriedade intelectual e capacitação de recursos humanos em empreendedorismo, gestão da inovação, transferência de tecnologia.
“A ICT vai ter que formar um grupo de trabalho e propor uma política de inovação com impacto no ambiente produtivo local, organizando esses instrumentos de forma a dar coerência, coesão e integração a eles, para obter esses impactos”, comentou Edilson da Silva.
Porém, para que a iniciativa ocorra, será necessário que o novo Marco Legal de CT&I seja regulamentado, o que na visão dos especialistas será um processo demorado e complicado. “Acredito que vão ser vários regulamentos e tudo será complexo e vai perdurar por muito tempo”, previu o consultor legislativo da Câmara dos Deputados, ao lembrar que, somente o MCTIC, demorou dez anos para regulamentar a Lei de Inovação.
Leandro Cipriano, da Agência Gestão CT&I
Fonte: Agência Gestão CT&I
Foto: Divulgação/Empresayeconomia
Relator na comissão, o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ) apresentou parecer pela aprovação da proposta, prevista no Projeto de Lei 4789/16, do deputado Rômulo Gouveia (PSD-PB).
A proposta apresentada pela comissão permite a dedução sobre o importo de renda devido pelas pessoas físicas e jurídicas, referentes aos valores doados para programas, projetos e atividades de ciência, tecnologia e inovação. Segundo o relator, o Deputado Celso Pansera, a questão sana problemas com o financiamento de projetos de CT&I, que dependem de recursos federais e a integração entre empresas do setor e a sociedade. Portanto, Fica estabelecido teto para a dedução na ordem de 10%, para pessoas físicas, e 8% para pessoas jurídicas. Dos totais doados, somente 90% (PF) ou 50% (PJ) poderão ser deduzidos do imposto devido sobre o lucro real.
Segundo o Deputado Celso Pansera, “Existem institutos e empresas em nosso País realizando pesquisa de ponta nos mais diversos ramos da ciência e tecnologia, como a Embrapa. Infelizmente, é muito comum que essas instituições fiquem dependentes de dotações orçamentárias oriundas do governo federal, tornando-as reféns de um processo de financiamento pouco flexível e sujeito às conveniências políticas do momento”.
O texto, que é um substitutivo ao Projeto de Lei 5425/16, do deputado Rômulo Gouveia (PSD-PB), altera e define alguns pontos do projeto, tais como:
- Retira a proibição, prevista no texto original, de as pessoas jurídicas darem publicidade às doações realizadas, sob pena de perderem os benefícios;
- Obriga o ministério responsável pela gestão do programa a tornar pública a lista dos projetos aprovados passíveis de captação de doações.
- Retira ainda a menção à Lei do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Lei 540/07), a fim de evitar a interpretação de que apenas projetos já beneficiados pelo fundo serão contemplados pelo novo mecanismo.
- Define uma série de regras para captação e uso das verbas destinadas ao programa.
- Determina que os relatórios preparados anualmente pelo órgão responsável pela implementação da política de ciência, tecnologia e inovação contenham os valores recebidos pelos programas e os aportados pelos contribuintes.
A proposta altera leis que tratam do Imposto de Renda da Pessoa Física (9.250/95) e da Jurídica (9.249/95).
ÍNTEGRA DA PROPOSTA: http://www.camara.gov.br/internet/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=2086081
Fonte: ‘Agência Câmara Notícias‘
Foto: Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Ao contrário do Brasil, cujas leis de incentivo à inovação colocam entraves burocráticos para a realização de pesquisas, a Argentina decretou o plano “Argentina Empreende”, que facilita a abertura de empresas pela internet. Em 24 horas a empresa estará devidamente cadastrada no AFIP (correspondente ao cadastro de CNPJ) e com conta bancária aberta, numa modalidade entitulada “Sociedade por Ações Simplificadas”, que visa o crescimento rápido, com estatutos flexíveis, ideais para smart-ups. Pode-se criar, também, a figura jurídica da “Empresa de Interesse Coletivo”, que devem gerar impacto na própria rentabilidade, sustentabilidade e aspectos socioambientais. Além disso, foram criados 10 fundos de apoio à inovação, seguindo o modelo de Israel, cujo objetivo é incentivar ideias e talentos argentinos.
Já aqui, no Brasil, que posiciona-se no 174º (entre 189 posições), no ranking do Banco Mundial que mede a dificuldades de abrir um negócio, são necessários 83 dias para iniciar um negócio. Perdemos para todos os países latino-americanos, exceto a Venezuela.
O que falta para o Brasil é a desburocratização do empreendedorismo e um fortalecimento do incentivo à pesquisas da ciência, tecnologia e inovação. Não é à toa que o centro de discussão do 34º Encontro do Confies estará voltado para o assunto. A programação traz para discussão central o excesso de burocracia e as barreiras ao desenvolvimento da pesquisa no Brasil, bem como seus impactos e prejuízos ao setor, através de palestras, oficinas e dos fóruns temáticos.
O CONFIES participa hoje (31), representado pela sua Presidente Suzana Montenegro, do seminário temático ANDIFES: Universidade, Ciência, Tecnologia, Inovação e Desenvolvimento, que acontece na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).
O orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que já foi reduzido em 50% para este ano, pode cair pela metade novamente em 2017, eliminando a capacidade da Finep – empresa pública que administra o fundo – de fazer novos investimentos em pesquisa no país.
O limite de empenho previsto para o FNDCT no Projeto de Lei Orçamentária Anual 2017, segundo a Finep, é de R$ 982 milhões, comparado a R$ 1,9 bilhão neste ano e R$ 4 bilhões, em 2015, em valores corrigidos. Isso, apesar de a arrecadação anual do FNDCT permanecer constante, na casa dos R$ 3,7 bilhões, e de a Finep ter restos a pagar da ordem de R$ 2 bilhões, referente a editais já contratados nos últimos anos.
O orçamento atual “não dá nem para cobrir os restos a pagar dos anos anteriores”, disse o presidente da Finep, Wanderley de Souza, em palestra na reunião anual da SBPC, em julho, em Porto Seguro (BA). “Permite continuar o que estamos fazendo, mas não lançar coisas novas.” Procurado novamente para esta reportagem, Souza preferiu não dar entrevista.
“O orçamento de 2016 e a proposta orçamentária para 2017 não são suficientes para fazer frente aos compromissos já assumidos”, informou a assessoria de comunicação da Finep. “No entanto, o presidente (Wanderley de Souza) está otimista quanto às ações do ministro Kassab no sentido de ampliar o orçamento.”
O FNDCT é abastecido anualmente com recursos oriundos de vários setores da indústria – por exemplo, de impostos sobre a exploração de recursos hídricos e minerais -, e seus recursos deveriam, por lei, ser investidos integralmente em ciência e tecnologia. Mas não é o que acontece. Nos últimos anos, os recursos do FNDCT foram sistematicamente contingenciados para manutenção do superávit primário. “Estão coletando impostos para uma finalidade e aplicando em outra”, diz o presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich. “É um tipo de pedalada. Tenho até dúvidas sobre a legalidade disso.”
Várias entidades da comunidade científica acadêmica e empresarial enviaram uma carta conjunta ao Congresso Nacional na semana passada, solicitando que o fundo não seja mais contingenciado. “É fundamental que o orçamento do FNDCT para 2017 permita a utilização plena dos recursos que serão arrecadados, de modo a se reverter o grave quadro atual”, diz o documento. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte:http://noticias.uol.com.br/…/fundo-nacional-para-ciencia-po…

Comunidade científica e Tecnológica, parlamentares e do governo debateram o novo marco legal de CT&I em seminário – Foto: Pedro França/Agência Senado
Desde que assumiu a presidência da república interinamente Michel Temer tem sido cobrado pela edição de uma Medida Provisória (MP) para recompor os vetos do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/2016). O texto até já foi elaborado e tem o aval dos ministérios da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e do Desenvolvimento, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), mas há entraves na Esplanada que têm adiado o envio do material para apreciação do Legislativo.
Nesta terça-feira (2), durante seminário sobre a Lei 13.243, entidades do setor de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) e parlamentares pressionaram o ministro Gilberto Kassab por uma resposta do Executivo para a demora da publicação da MP, que derrubaria, de uma só vez, todos os vetos feitos pela presidente Dilma Roussef em janeiro deste ano.
“Uma Medida Provisória é a forma mais rápida de reparar esses vetos a uma matéria que foi construída de forma suprapartidária, envolvendo a academia, setor produtivo e a comunidade científica”, disse o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), relator do PLS n° 226/2016, que visa restaurar o texto original do Marco Legal de CT&I. Pelas vias do Legislativo, a matéria precisa se analisada por comissões da Casa para depois ir ao Plenário. Já o rito de tramitação da MP é o inverso. A partir da publicação no Diário Oficial da União o texto passa a valer. Deputados e Senadores formam uma comissão mista para analisar o texto e têm até 45 dias para aprovar ou rejeitar a MP.
O ministro Gilberto Kassab garantiu que, politicamente, o presidente interino está convencido sobre a importância de derrubar os vetos, mas apontou que há entraves na Receita Federal, vinculada ao Ministério da Fazenda. A pasta é comandada por Henrique Meireles. “Por coerência, a Receita Federal não quer mudar de posicionamento. Foi ela quem sugeriu os vetos. A argumentação técnica é a ‘falta de vinculação de receitas específicas para os itens vetados, o que poderia gerar um descontrole nas finanças públicas’. O que é um exagero. Na minha visão, essa manifestação [pela retomada dos vetos] pode se dar mais rapidamente pela votação do PLS 226”, disse o ministro, que declarou durante o seminário ser favorável à edição da Medida Provisória.
Para o secretário de Ciência e Tecnologia do Ceará, Inácio Arruda, que também participou do seminário, o Palácio do Planalto deveria assumir o protagonismo. “A Receita Federal nunca será convencida. Ela é um órgão de arrecadar e orientar. O papel de decidir é do governo federal. Se a Fazenda e a Casa Civil derem o aval esse texto vem para o Congresso Nacional”, destacou o secretário.
O deputado Izalci (PSDB-DF) avaliou que há falta de vontade política para resolver a questão. “Estamos em ano eleitoral e isso torna o processo legislativo mais lento. Se optarmos pela tramitação, a matéria pode levar até dois anos para ser aprovada nas duas casas, sem contar o risco de engavetamento”, alertou o parlamentar, que é um dos principais entusiastas da causa de CT&I no Congresso Nacional. “A cada minuto que passa os prejuízos são imensos. Não se faz CT&I com a Legislação que existe hoje, que inclusive está pior do que era antes. Há uma insegurança jurídica em diversos pontos por conta da falta de regulamentação da norma sancionada em janeiro.”
Durante o seminário, ficou acertada a criação de um grupo de parlamentares e membros das comunidades científicas, tecnológicas e empresariais que irá se reunir com os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira, para apontar os impactos da manutenção dos vetos produtividade e competitividade da indústria nacional. Eles também receberão convites para falar sobre o tema em uma possível audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara. Os deputados Izalci, Celso Pansera (PMDB-RJ) e Vítor Lippi (PSDB-SP) vão apresentar um requerimento para convocação dos ministros na reunião do colegiado nesta quarta-feira (3).
Regulamentação
Há seis meses, o Marco Legal da CT&I foi aprovado. O texto passou por consulta pública para depois ser regulamentado. No entanto, o processo que deixa claro como serão as atividades de pesquisa em ambiente acadêmico e empresarial, além da relação entre esses setores, está parado.
O secretário de Inovação do MDIC, Marcos Vinícius de Souza, sugeriu que, para apontar os caminhos da regulamentação do Lei 13.243, fosse mantido unido e atuante o grupo de entidades que participaram dos debates de elaboração do projeto que deu origem à norma. “Esse grupo de atores traz o ponto de vista do usuário. Eles é que devem ser a voz para construir uma regulamentação flexível e desburocratizada. Se a regulamentação for feita pelo governo, um dos gargalos que pode haver é o excesso de burocracia. MCTIC e MDIC já têm um texto base para discutir com esse grupo que vai trazer as contribuições de quem vai usar o sistema”, disse o secretário.
Para a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, o Brasil perde tempo enquanto se discute os vetos e não se regulamenta o Marco Legal de CT&I. “As pessoas não querem usar os benefícios da Lei 13.243 pela falta de regulamentação e insegurança jurídica causada pelos vetos. Além disso, temos que revisar algumas legislações que estão contrárias à modernidade. Fico preocupada porque a Lei de Acesso à Biodiversidade, que foi trabalhada por 12 anos, no processo de regulamentação perdeu muitos dos ganhos que haviam sido conquistados com a aprovação da norma”, lamentou.
(Felipe Linhares, da Agência Gestão CT&I)
O brasileiro nasce, cresce e se desenvolve convivendo com processos burocráticos. A “cartorização” da estrutura pública afeta todos os setores da sociedade, o que inclui as atividades de ciência, tecnologia e inovação (CT&I). Para comprar um insumo para pesquisa é preciso travar uma batalha burocrática até recebê-lo e, ainda, corre o risco de ser punido pelos órgãos de controles do País. A judicialização é um dos mais graves problemas que o cientista brasileiro lida.
A burocracia cerca as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). A situação, que beira a surrealidade, faz parte do dia a dia do pesquisador. Exemplos não faltam. O Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ) já teve projetos interrompidos por falta de uma assinatura.
“Já tivemos esse problema com um projeto de R$ 1,7 milhão. Também tivemos uma parcela de R$ 2,3 milhões interrompida porque tínhamos que publicar no Diário Oficial da União uma notinha informando a licitação que fizemos. Isto custava R$ 121, mas não estava no orçamento e então tivemos que pagar”, relatou o diretor de Orçamento e Finanças da Coppe, Fernando Peregrino, durante seminário que debateu os desafios e impactos do Marco Legal de CT&I (Lei 13.243/16), nesta terça-feira (2), no Senado Federal. “A gente esqueceu da correção monetária que era de R$ 6,17 e isso paralisou a pesquisa. A professora ficou três meses parada porque a parcela não veio.”
O Marco Legal da CT&I foi criado para dar segurança jurídica para os atores que atuam na área de CT&I. No entanto, apesar de ter sido aprovado por unanimidade nas duas casas do Legislativo, a presidente Dilma vetou parte do texto, impactando a relação entre instituições científicas e tecnológicas (ICTs).
Fernando Peregrino, que também é vice-presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), lembrou que a burocracia atrasa o País. “O Brasil importava catalisadores para fazer o petróleo virar gasolina e diesel. Os cientistas depositaram duas patentes num projeto que gerou economia para a Petrobras. O estudo rendeu um prêmio de talentos da companhia. Mas o projeto foi interditado. Tivemos que devolver R$ 3 milhões porque ele durou cinco anos, um pouco a mais do que limite que não pode ser estendido. Isso é devastador para o ânimo da comunidade acadêmica”, disse Peregrino ao relembrar a inciativa que recebeu R$ 33 milhões de investimento.
Na avaliação do consultor jurídico do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), Bruno Portela, a Lei 13.243/16 cria um ambiente mais flexível e desburocratiza os processos. “ A nova prestação de contas priorizará o resultado acima de tudo. O pesquisador será cobrado pela parte administrativa após a conclusão do projeto. Isto traz tranquilidade para os cientistas”, explica.
Portela, contudo, alerta para a necessidade de haver um amplo esforço de todos os envolvidos no setor de CT&I para que na regulamentação da Lei não haja interpretações erradas dos dispositivos estabelecidos pela norma. “Estamos em contato com os pesquisadores, instituições de pesquisa e setor produtivo para conseguir a simplicidade na cobrança. Buscamos um entendimento, por meio de um grupo de trabalho a CGU [Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle] e o TCU [Tribunal de Contas da União] para que eles tragam a visão deles para dentro do decreto com o objetivo de chegarmos a um consentimento e que tenhamos uma única interpretação da Lei”.
Prejuízo
Apesar do novo arcabouço legal constituído pela Lei 13.243, ainda há uma série de incertezas no setor. Isto ocorre em virtude dos dispositivos vetados da matéria. A concessão de bolsas foi uma situação diretamente atingida pela retirada dos dispositivos. O secretário de Políticas e Programas de Pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), durante exposição no seminário, relatou detalhadamente as implicações neste quesito.
“Os vetos retiraram a possibilidade de alunos de ICTs privadas de receber bolsa de estímulo à inovação, que é uma questão extremamente complexa. Também retiraram a previsão da não integração da base de cálculo da contribuição previdenciária das bolsas do âmbito de projetos de estudos específicos que era um outro avanço significativo”, expôs. “Em linhas gerais, os vetos acabaram trazendo insegurança jurídica”.
Na abertura do seminário, parlamentares e entidades de CT&I cobraram do governo federal uma Medida Provisória (MP) para recompor vetos do Marco Legal, que afeta também o setor empresarial. De acordo com a diretora de inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Gianna Sagazio, a retirada do dispositivo referente à isenção do imposto de importação vai prejudicar empresas e instituições de ciência e tecnologia.
“Em um momento em que vivemos uma desindustrialização, o setor industrial precisa de estímulos como ocorre em qualquer País desenvolvido. Não se trata de apenas arrecadar, mas também de estimular as empresas a produzir produzir para que o Estado possa arrecadar e gerar empregos de qualidade.”
(Leandro Duarte, da Agência Gestão CT&I)
O ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab, manifestou, nesta segunda-feira, 1º, sua preocupação com os níveis atuais dos investimentos brasileiros em pesquisa e inovação. “A avaliação que deve ser feita hoje é sobre o peso necessário da área na conjuntura da nossa economia, qualquer que seja o momento que vive a nossa economia”, disse o ministro, que participou hoje das comemorações dos 50 anos da Finep, no Rio de Janeiro.
Kassab ressaltou a participação do órgão nos “avanços extraordinários” da produção nacional de pesquisa e desenvolvimento nas últimas cinco décadas. Mas afirmou que a redução do orçamento da pasta de R$ 9,5 bilhões, aprovado em 2013, para os atuais R$ 4,2 bilhões representa uma escolha política de não valorizar “um setor tão estratégico, que efetivamente pode contribuir para a retomada do crescimento e do desenvolvimento do País”. “Essa é a razão do nosso alerta permanente e interno, com muita lealdade, dentro do governo federal, para que possamos corrigir essa enorme distorção”, salientou.
“Mais do que um consenso, existe uma unanimidade de que a pesquisa, a ciência e a tecnologia tiveram avanços extraordinários nas últimas décadas”, comentou o ministro. “A Finep teve uma grande participação nisso. E eu quero ser um dos agentes, ao lado de pessoas muito mais preparadas, para que, daqui a meio século, a agência possa festejar 100 anos de muito êxito, muito investimento e muita contribuição para o desenvolvimento do País.”
Fonte: Teletime