Desde que assumiu a presidência da república interinamente Michel Temer tem sido cobrado pela edição de uma Medida Provisória (MP) para recompor os vetos do Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei 13.243/2016). O texto até já foi elaborado e tem o aval dos ministérios da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e do Desenvolvimento, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), mas há entraves na Esplanada que têm adiado o envio do material para apreciação do Legislativo.
Nesta terça-feira (2), durante seminário sobre a Lei 13.243, entidades do setor de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) e parlamentares pressionaram o ministro Gilberto Kassab por uma resposta do Executivo para a demora da publicação da MP, que derrubaria, de uma só vez, todos os vetos feitos pela presidente Dilma Roussef em janeiro deste ano.
“Uma Medida Provisória é a forma mais rápida de reparar esses vetos a uma matéria que foi construída de forma suprapartidária, envolvendo a academia, setor produtivo e a comunidade científica”, disse o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), relator do PLS n° 226/2016, que visa restaurar o texto original do Marco Legal de CT&I. Pelas vias do Legislativo, a matéria precisa se analisada por comissões da Casa para depois ir ao Plenário. Já o rito de tramitação da MP é o inverso. A partir da publicação no Diário Oficial da União o texto passa a valer. Deputados e Senadores formam uma comissão mista para analisar o texto e têm até 45 dias para aprovar ou rejeitar a MP.
O ministro Gilberto Kassab garantiu que, politicamente, o presidente interino está convencido sobre a importância de derrubar os vetos, mas apontou que há entraves na Receita Federal, vinculada ao Ministério da Fazenda. A pasta é comandada por Henrique Meireles. “Por coerência, a Receita Federal não quer mudar de posicionamento. Foi ela quem sugeriu os vetos. A argumentação técnica é a ‘falta de vinculação de receitas específicas para os itens vetados, o que poderia gerar um descontrole nas finanças públicas’. O que é um exagero. Na minha visão, essa manifestação [pela retomada dos vetos] pode se dar mais rapidamente pela votação do PLS 226”, disse o ministro, que declarou durante o seminário ser favorável à edição da Medida Provisória.
Para o secretário de Ciência e Tecnologia do Ceará, Inácio Arruda, que também participou do seminário, o Palácio do Planalto deveria assumir o protagonismo. “A Receita Federal nunca será convencida. Ela é um órgão de arrecadar e orientar. O papel de decidir é do governo federal. Se a Fazenda e a Casa Civil derem o aval esse texto vem para o Congresso Nacional”, destacou o secretário.
O deputado Izalci (PSDB-DF) avaliou que há falta de vontade política para resolver a questão. “Estamos em ano eleitoral e isso torna o processo legislativo mais lento. Se optarmos pela tramitação, a matéria pode levar até dois anos para ser aprovada nas duas casas, sem contar o risco de engavetamento”, alertou o parlamentar, que é um dos principais entusiastas da causa de CT&I no Congresso Nacional. “A cada minuto que passa os prejuízos são imensos. Não se faz CT&I com a Legislação que existe hoje, que inclusive está pior do que era antes. Há uma insegurança jurídica em diversos pontos por conta da falta de regulamentação da norma sancionada em janeiro.”
Durante o seminário, ficou acertada a criação de um grupo de parlamentares e membros das comunidades científicas, tecnológicas e empresariais que irá se reunir com os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira, para apontar os impactos da manutenção dos vetos produtividade e competitividade da indústria nacional. Eles também receberão convites para falar sobre o tema em uma possível audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara. Os deputados Izalci, Celso Pansera (PMDB-RJ) e Vítor Lippi (PSDB-SP) vão apresentar um requerimento para convocação dos ministros na reunião do colegiado nesta quarta-feira (3).
Regulamentação
Há seis meses, o Marco Legal da CT&I foi aprovado. O texto passou por consulta pública para depois ser regulamentado. No entanto, o processo que deixa claro como serão as atividades de pesquisa em ambiente acadêmico e empresarial, além da relação entre esses setores, está parado.
O secretário de Inovação do MDIC, Marcos Vinícius de Souza, sugeriu que, para apontar os caminhos da regulamentação do Lei 13.243, fosse mantido unido e atuante o grupo de entidades que participaram dos debates de elaboração do projeto que deu origem à norma. “Esse grupo de atores traz o ponto de vista do usuário. Eles é que devem ser a voz para construir uma regulamentação flexível e desburocratizada. Se a regulamentação for feita pelo governo, um dos gargalos que pode haver é o excesso de burocracia. MCTIC e MDIC já têm um texto base para discutir com esse grupo que vai trazer as contribuições de quem vai usar o sistema”, disse o secretário.
Para a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, o Brasil perde tempo enquanto se discute os vetos e não se regulamenta o Marco Legal de CT&I. “As pessoas não querem usar os benefícios da Lei 13.243 pela falta de regulamentação e insegurança jurídica causada pelos vetos. Além disso, temos que revisar algumas legislações que estão contrárias à modernidade. Fico preocupada porque a Lei de Acesso à Biodiversidade, que foi trabalhada por 12 anos, no processo de regulamentação perdeu muitos dos ganhos que haviam sido conquistados com a aprovação da norma”, lamentou.
(Felipe Linhares, da Agência Gestão CT&I)