Presidente do CONFIES, Fernando Peregrino e a maioria dos reitores defenderam a aprovação da PEC 24/19, em tramitação na Câmara dos Deputados, que libera receitas próprias das universidades
Em audiência pública realizada na terça-feira, 17, na Comissão de Educação (CE) do Senado Federal, reitores e ex-reitores de universidades federais expressaram preocupação com pontos do Future-se, programa do Ministério da Educação (MEC), e defenderam a atuação das fundações de apoio à atividade de pesquisa no projeto. O debate reuniu seis reitores, dois ex-reitores e o presidente do CONFIES, Fernando Peregrino. O MEC já sinalizou que incluiria as fundações de apoio no programa.
Os convidados expressaram preocupação com a eventual perda de autonomia das instituições, diante de contratos de gestão com organizações sociais (OSs), previstos no Future-se. Outros pontos preocupantes, segundo os convidados, é a criação do Comitê Gestor, além da complexidade da mudança de 17 leis vigentes.
No debate, mediado pelo presidente da Comissão, o senador Dário Berger (MDB-SC), a reitora da Universidade de Brasília (UnB), Márcia Abrahão Moura defendeu o papel das fundações de apoio e afirmou que falta clareza sobre vários pontos da minuta enviada pelo MEC às universidades.
“O texto propõe a criação de um fundo de natureza privada como alternativa para o financiamento de pesquisa, inovação e internacionalização e também não há clareza sobre como vai funcionar e qual é o papel do Estado nesse fundo”, criticou.
Universidade e empresa
Márcia também considerou redundantes outros pontos do Future-se, como o que sugere a relação entre universidade e empresa para transferência de tecnologia. “Já fazemos tudo o que Future-se propõe, seja pela própria universitária, seja pelas nossas fundações de apoio. Não seria de interesse da UFMG aprovar uma proposta que já fazemos e ainda submeter nossa instituição a contratos com OSs (com risco de comprometer a autonomia)”, destacou.
O reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rui Oppermann concordou com o fato de que as organizações sociais tendem a agredir a autonomia das instituições. “Há uma grande relativização, se não a agressão frontal, que ele representa à autonomia universitária, embora se apresente como algo que vai melhorar ou facilitar nossa autonomia”, disse.
No entendimento da reitora da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Soraya Smaili, quaisquer mudanças das legislações vigentes precisam ser consideradas “as nossas fundações de apoio que já existem e que estão consolidadas” na gestão da atividade de pesquisa das universidades.
Outra convidada para o debate, a reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sandra Regina Goulart Almeida também defendeu o trabalho das fundações de apoio e expressou preocupação com o risco de perda da autonomia das instituições de ensino. “Não somos contra a transferência de ciência e tecnologia. Pelo contrário, queremos fazer mais, mas há várias restrições (no Future-se), principalmente em relação à autonomia universitária. Para fazer mais e melhor e promover parceria com empresas, precisamos de mais flexibilidade”, reforçou.
Resistência
Já a reitora da Universidade Federal de São Carlos (UFScar), Wanda Hoffmann analisou os prós e os contras do Future-se e afirmou que o projeto pode trazer vantagens, mas existem riscos que precisam ser considerados, como a ameaça à autonomia universitária por intermédio das OSs. Para Wanda, a resistência à proposta pode ser minimizada a partir de vários ajustes, um deles a inclusão das fundações de apoio, já que, segundo afirmou, a universidade não teve experiência positiva com OSs.
Com posicionamento semelhante, a reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho citou a experiência bem sucedida da universidade com a COPPETEC há mais de 40 anos e defendeu veemente a autonomia universitária. Para ela, qualquer mudança negativa que acontecer na pós-graduação haverá impacto considerável na produção científica nacional.
“Não queremos que haja fragmentação entre pesquisa pura e aplicada”, defendeu Denise.
A reitora da UFRJ criticou ainda o contingenciamento do orçamento e afirmou que o corte de recursos deverá comprometer as metas do Plano Nacional da Educação (PNE) para formação de mestres e doutores que, por tabela, trará impactos negativos sobre a oferta de professores para o ensino básico.
CONFIES
O presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (CONFIES), Fernando Peregrino reafirmou que as organizações sociais tendem a cercear a liberdade das universidades federais de ensino superior.
“O ideal seria colocar as fundações de apoio no projeto, porque a organização social é uma ameaça real à autonomia. O contrato de gestão é o gatilho dessa ameaça”, disse Peregrino. Ele alerta ainda sobre o risco do comitê gestor, previsto no programa, de engolir de vez a gestão das instituições de ensino.
PEC da liberação de receitas próprias
Peregrino e a maioria dos reitores defenderam a aprovação da PEC 24/19, em tramitação na Câmara dos Deputados, que libera receitas próprias das universidades. Peregrino analisou o baixo crescimento da atividade econômica e afirmou que a aprovação dessa PEC seria a “salvação da pátria”.
“É um absurdo que as receitas próprias das universidades tenham como destino o superávit primário para os credores da dívida se locupletarem”, criticou.
Para Peregrino, a programação orçamentária para 2020 representa “um desastre” e as expectativas são negativas diante da atual conjuntura. “Estamos vivendo uma crise do atual modelo, movido a forte ajuste fiscal para o pagamento do juro da dívida pública e a desindustrialização. Com crescimento zero, ninguém passará imune dessa crise”, alertou.
O presidente do CONFIES criticou ainda o processo de desindustrialização do País, em meio ao baixo investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), em 1,2% ao ano em média, na contramão de países industrializados. “Estamos a caminho do desastre, somos o País dos bancos. Sem indústria não há inovação”, lamentou.
Na tentativa de reverter tal cenário, Peregrino falou sobre o potencial das fundações de apoio de alavancar recursos para atividade de pesquisa das universidades públicas. Hoje o setor capta R$ 5 bilhões ao ano. Individualmente, a COPEETEC, fundação de apoio da UFRJ, captou mais de R$ 300 milhões em 2018 de empresas como Shell, Vale do Rio Doce e Petrobras para projetos de pesquisa científica, segundo Peregrino.
Dessa forma, ele destacou pontos positivos do Future-se que podem ser aproveitados para aumentar ainda mais recursos para atividade de pesquisa, como a queda do veto para implementação de incentivos fiscais aos fundos patrimoniais das universidades.
Posição de parlamentares
O senador Augusto Anastasia (PSDB-MG) disse ser entusiasta do modelo das fundações de apoio e afirmou que, quando o projeto Future-se chegar ao Senado, “vamos nos debruçar para aperfeiçoar a proposta”. Já o senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que o programa comprometendo a autonomia universitária não terá o seu apoio.
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